domingo, 29 de dezembro de 2013

Vontade: “atos deliberados”


A formação – dizíamos – é um caminho necessário para adquirir as virtudes e, por isso, meditamos nos três passos que devem ser seguidos: contemplar exemplos de virtudes, deixar-nos cativar pela sua beleza, e aprofundar intelectualmente nelas (cap. 12).

Falta, porém, um quarto passo, sem o qual os outros três ficariam sendo mera teoria: a decisão de viver, na prática, dia a dia, as virtudes. O Catecismo quando diz que «as virtudes humanas são adquiridas pela educação», acrescenta: e «por atos deliberados» (n. 1810). 


«Atos deliberados» não são teorias. Devem ser mesmo «ações» realizadas com «deliberação», ou seja, conscientemente. Por outras palavras, devem ser atos pensados, queridos e praticados. 

Há atos em si mesmos bons, mas que não são deliberados. 

Atos não deliberados Não são deliberados, concretamente: – Os atos puramente mecânicos, sempre repetidos, tão habituais que perderam o sentido. Todos temos desses atos “bons” automáticos, sem alma, desde saudações rotineiras até orações costumeiras. Não são hábitos virtuosos, isto é, uma sequência de atos pensados e queridos que geram virtudes; são meras “habituações”, repetições mecânicas. 
A este propósito, vem-me à memória um filme antigo, da época do neorrealismo italiano, protagonizado por Aldo Fabrizi, ator muito popular. Encarnava no filme a figura de um operário que sobe num bonde de manhã cedo, sonolento e mal-humorado. Ao pagar o bilhete cumprimenta o cobrador, como todos os dias, resmungando um “Buon giorno” – “Bom dia”. 
O cobrador responde, aborrecido: “Não custa nada cumprimentar!”. O outro se irrita: “Mas se acabo de dizer : Buon giorno”. E o cobrador retruca: Ma c’è Buon giorno e Buon giorno!”- “Mas há ‘Bom’ dia e ‘Bom dia’!”… Tinha toda a razão.
– Também são «indeliberadas» certas rotinas no trabalho, no relacionamento familiar, na prática religiosa. Acontece isso quando cada dia é uma vulgar fotocópia do dia ou da semana anterior, uma fotocópia cada vez mais esbatida, mais amarela e esvaziada de sentido. Não acha que essa má rotina já foi causa de muitas decadências familiares, de declínios profissionais e de esmorecimentos religiosos…? 
– Tampouco são «deliberados» comportamentos habituais, bons em si, mas que são apenas “reativos”. Não procedem de um querer lúcido, mas do “instinto” de “ficar bem” perante determinadas pessoas ou ambientes. 
– De modo geral, como já sabe, também não são virtuosos os comportamentos viciados por uma intenção torta, como o interesse, a vaidade, a humilhação dos outros e o exibicionismo. 

“Deliberações” decisivas.

Todos precisamos dar, na vida, viradas decisivas, sem as quais só teremos “continuísmo”: rotina e decadência. Essas viradas dependem, normalmente, de decisões refletidas – “agora vejo!”, “não posso continuar assim!” –, assumidas com uma vontade (um querer) eficaz. Por exemplo, decidirmo-nos a largar um vício; a parar de hesitar quando fica claro que devemos dizer “sim” sem mais delongas a uma vocação, a uma conversão, ao casamento, a ter mais um filho, a pedir perdão. 
A partir de uma decisão dessas, sincera, a vida pode entrar numa nova “rota de virtudes”, que nos eleve muito, humana e espiritualmente. Naturalmente, a “conversão” é apenas o detonador de muitos atos virtuosos que deveremos praticar (falaremos disso no próximo capítulo). 
Isso foi o que aconteceu com Santo Agostinho quando, após anos de reflexão, oração, hesitação, medo e angústia, resolveu pôr ponto final aos desvarios, abraçar fé católica, praticar a castidade e receber o batismo. Com a ajuda de Deus, foi o início de um dos roteiros mais maravilhosos de santidade, virtudes heroicas e sabedoria cristã da história. 
Para isso, porém, é preciso que a vontade não fique num “desejaria”, mas que seja um “quero” formulado com toda a alma. Quantas vezes não se poderiam aplicar a nós estas palavras: «Um querer sem querer é o teu» (Caminho, n. 714); e ainda estas outras: «Dizes que sim, que queres. – Está bem. – Mas…queres como um avaro quer o seu ouro, como uma mãe quer ao seu filho, como um ambicioso quer as honras, ou como um pobre sensual o seu prazer? – Não? Então não queres» (Ibidem, n. 316). 

Temos “boa vontade” ou “vontade boa”? 

Há um ditado que diz que “o inferno está cheio de boas vontades”, daquelas vontades que, na realidade, não querem. 
Para ter virtudes autênticas, insisto, são necessárias decisões iniciais firmes – “ vontades boas” –, que nos lancem a assumir, com coragem e fé em Deus, uma luta prolongada, com empenho incessante concretizado por meio de muitos atos deliberados pequenos e constantes. Só assim se forja o caráter e a personalidade do cristão.
Lembra o que dizia São Paulo? «Nas corridas de um estádio, todos correm, mas bem sabeis que um só recebe o prêmio. Correi, pois, de tal maneira que o consigais» (1 Cor 9,24). 
Não sei se corremos dessa maneira atrás das virtudes. Mas seria muito bom que o fizéssemos, começando por algumas., bem claras e definidas.
Pense: Que metas de virtude tenho agora? Que corrida quero vencer? Talvez lhe custe dar uma resposta. Sabe por quê? Porque não pensa na vida como deveria fazê-lo. 
Aquele que não se esforça por ter frequentemente momentos tranquilos e sinceros – paradas no meio da agitação diária – para meditar sobre a vida, fazer balanço e tirar conclusões, está se condenando a “ir tocando o barco” e a chegar ao porto errado,com o barco vazio de virtudes e atulhado de rotina. 

Alguns meios de conseguir “deliberações decisivas” 

É impossível decidir-se a ganhar virtudes sem meditar sobre elas, sem oração mental séria, sem exame de consciência frequente. “É que não sei fazê-lo” – talvez me diga. Não seja por isso. Não custa nada aprender, treinar e conseguir[1]. Para começar, sugiro-lhe o seguinte: 
–logo que for possível e tiver um mínimo de preparo, faça um retiro espiritual 
– veja o modo de participar (semanalmente, mensalmente…) de palestras ou meditações de espiritualidade cristã, para “abrir” os olhos e enriquecer a mente e o coração
– decida-se a dedicar todos os dias um tempo fixo a uma leitura meditada da Bíblia (todo cristão deveria fazê-lo!) e de algumas obras de espiritualidade cristã; mas que seja uma leitura refletida e “aplicada” às realidades da sua vida atual 
– com toda a liberdade, sugiro-lhe que procure alguém que lhe possa dar, com regularidade – por exemplo, mensalmente –, uma orientação espiritual cristã: um diretor espiritual que conheça sua vida, seus problemas, suas aspirações e suas lutas, seus avanços e seus tropeços, e possa aconselhá-lo 
– defina já, antes da passar para o próximo capítulo, a virtude mais “urgente”, a que mais falta lhe faz, e aponte para ela todas as baterias espirituais, de grosso e médio calibre (orações, sacrifícios, sacramentos, etc.), sob a moderação do orientador da sua alma… 
São Josemaria dizia que, «de certo modo, a vida humana é um constante retorno à casa do nosso Pai. Retorno mediante a conversão do coração, que se traduz no desejo de mudar, na decisão firme de melhorar de vida, e que, portanto, se manifesta em atos de sacrifício e de doação» (É Cristo que passa, n. 64). 
Peça a Deus essa resolução firme, que tantas vezes nos falta. Peça-lhe um “querer que queira”. Diga a seu coração que deseja ser sincero. E sinta o estímulo dos santos, que agiram assim, foram felizes e souberam fazer felizes os demais. 
Oxalá todos nós pudéssemos fazer com plena sinceridade a oração que fazia São Josemaria Escrivá: «Meu Deus, quando é que me vou converter? (Forja, n. 112). [1] Se desejar conhecer mais a fundo o modo de praticar esses meios de formação espiritual, pode ser útil ler o livro Para estar com Deus, São Paulo 2012, da Ed. Cultor de Livros (cultordelivros@cultordelivros.com.br)

Pe. Faus
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